quarta-feira, 29 de abril de 2009

Abril de vida, Abril de memória

As comemorações oficiais do 25 de Abril na sede do concelho tiveram dois momentos particularmente brilhantes: a cerimónia evocativa junto do monumento aos combatentes da guerra colonial e o lançamento do livro “Arlindo Vicente e a Oposição – As eleições Presidenciais de 1958”.
Da primeira importa registar a leitura de poemas de Abril, da autoria de Sophia de Mello Breyner, Manuel Alegre e do nosso Armor Pires Mota. A poesia da paz que Abril trouxe falou mais alto que a canção da guerra que Manuel Alegre chorou no seu 2º livro de poemas, O Canto e as Armas (Editora Nova Realidade, 1967 e Ed. Poesia Nosso Tempo, 1970).

No salão nobre da sede do município e após as usuais intervenções dos representantes dos partidos com assento na Assembleia Municipal e do Presidente desta, teve lugar a apresentação do livro de Arlindo Vicente, pintor, advogado e antifascista, nado e criado no Troviscal e que aceitou o desafio de enfrentar a ditadura salazarista no “simulacro cuidadosamente montado” das eleições presidenciais de 1958, para usar as palavras do também troviscalense Silas Granjo, coordenador e prefaciador do livro agora trazido a público sob a égide da Câmara Municipal.
Confirma-se o que ousei afirmar repetidas vezes em público e privado: o pelouro da Cultura do nosso município tem sabido cumprir o seu desígnio: são constantes as acções de promoção da cultura, da arte e do entretenimento.
Da autoria de Miguel Dias Santos, professor, investigador e autor de vários estudos sobre a nossa história contemporânea, o livro foi apresentado por um dos filhos de Arlindo Vicente, o prof. dr. António Pedro Vicente, que entre muitos recordares nos lembrou que

É através da memória que se constrói o futuro

- Título: Arlindo Vicente e a Oposição; autor: Miguel Dias Santos; Edição: Câmara Municipal de Oliveira do Bairro; tiragem: 1.000 exemplares; data da 1ª edição: 25 de Abril 2009.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

ABRIL COM R

Trinta anos depois querem tirar o r.
se puderem vai a cedilha e o til
trinta anos depois alguém que berre
r
de revolução r de Abril
r
até de porra r vezes dois
r
de renascer trinta anos depois
Trinta anos depois ainda nos resta
da liberdade o l mas qualquer dia
democracia fica sem o d.
Alguém que faça um f para a festa
alguém que venha perguntar porquê
e traga um grande p de poesia.
Trinta anos depois a vida é tua
agarra as letras todas e com elas
escreve a palavra amor (onde somos sempre dois)
escreve a palavra amor em cada rua
e então verás de novo as caravelas
a passar por aqui: trinta anos depois.
_
Manuel Alegre.
poema publicado na edição portuguesa de Le Monde Diplomatique, Abril 2004.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Futuro passado

Em finais dos anos 50/princípios de 60, Bustos era uma terra virada para o futuro.
A embalar o progresso, em 1936 um "brasileiro" da terra apostou num Centro Recreativo de Instrução e Beneficência, com salão de festas e cinema (o famoso Bustos Sonoro Cine, a que não faltou um então inédito sistema de assinaturas, precursor dos cineclubes dos anos 60). Teatro de revista, bandas de música, jornais, farmácia, estação telegráfica e postal, 2 equipas de futebol federado, clube de natação (com uma pequena piscina, onde participámos em tantas provas e brincadeiras), cafés com salas de bilhares, 2 restaurantes, talho, peixaria.

Cartão nadador_JamesUm sem fim de sinais duma terra de gente de progresso; e de ideias progressistas, de que foi exemplo a perseguida União Liberal de Bustos.
Nada parecia faltar nesses anos de ouro. Salvo a Liberdade.
Em princípios de 60, um grupo de bustuenses avança com uma Comissão de Melhoramentos, à qual se deve, nomeadamente, a criação duma sala de leitura da Biblioteca Calouste Gulbenkian, um colégio (então Externato Gil Vicente, hoje IPSB, com cerca de 1.000 alunos), posto da GNR e agência bancária.
Não nos faltaram dias, tardes e noites quentes, em especial as tardes quentes do Piri-Piri de que o saudoso Carlos Luzio falava.
Com o 25 de Abril chegaram os inevitáveis movimentos associativos de matriz social, personificados em duas instituições de solidariedade social - a ABC de Bustos e a SOBUSTOS. Não tardou a surgir o Orfeão de Bustos com o seu Grupo de Cantares.
E pouco mais.
Bustos foi morrendo, morrendo; mais de morte matada do que de morte morrida.

Diapositivo64

Tal como confessei AQUI, por nossa culpa, Bustos já foi.
Até renascer das cinzas do passado.
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- Bibliografia consultada: Arsénio Mota, Bustos - elementos para a sua história, edição da Associação de Beneficência e Cultura de Bustos, 1983; e, do mesmo autor, Bustos do Passado, em edição da Junta de Freguesia de Bustos, 2000. Busca nos blogues hiperligados.
- Fotos do Jaime e do Milton Costa (slide da conferência sobre a origem da vida).

terça-feira, 21 de abril de 2009

A Política

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Imagem extraída de "Rafael Bordalo Pinheiro", de José-Augusto França, Livraria Bertrand, 1982.
Foi dada à estampa no 1º número do jornal "A Paródia - Comédia Portugueza", fundado por Bordalo Pinheiro em 17 de Janeiro de 1900 e cujo último número data de 29 de Dezembro de 1906, cerca de um ano depois da morte do grande ceramista e caricaturista.

domingo, 19 de abril de 2009

HAH !...grande O'NEILL !

Há a mulher que me ama e eu não amo.
Há as mulheres que me acamam e eu acamo.
Há a mulher que eu amo e não me ama nem acama.
Ah essa mulher!

Tu eras feliz, Appolinaire:
montado num obus, voavas à mulher.
Tu foste mais feliz, meu artilheiro:
tiveste amor e guerra.

Eu andei para marinheiro,
mas pus óculos e fiquei em terra.

Upa garupa na mulher que me acama,

que a outra é contigo, coração que bem queres
sofrer pelas mulheres...
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Poema Hah !, a fls. 50/51 do caderno à margem, publicado pela D. Quixote em Março de 69.
Alexandre O'Neill nasceu em Lisboa a 19 de Dezembro de 1924 e faleceu a 21 de Agosto de 1986. Casou em 1971 com Teresa Patrício Gouveia e dela se divorciou em 81.
Teresa P. Gouveia teve a pouca sorte de ser ministra do ambiente de Cavaco numa altura (1994) em que lançámos um extraordinário movimento de luta contra a aprovação dum aterro de resíduos industriais no Cardal (Vagos). Foi penoso ver uma mulher com tão grande nível intelectual e humano envolvida na fogueira duma luta popular imparável e pouco dada a gestos cívicos.
O poder desgasta e, sobretudo, desilude gente que merecia melhor destino.
A ver se não me vou embora sem dar à estampa o vasto espólio que detenho sobre a matéria.

sábado, 18 de abril de 2009

outras músicas, d'outras margens

O borda d'água e o seringador

Prefiro o primeiro e já aqui o trouxe por alturas dos calores de verão.
Não sou cliente do 2º, mas foram de seringador as supostas declarações do recém eleito Presidente da Direcção Nacional da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, desembargador António Martins.
É que me pareceu ouvi-lo dizer após a cerimónia de tomada de posse que as maiorias absolutas são perigosas.
Importa-se de repetir?
E de explicar melhor se aludia à maioria absoluta que o elegeu ou à que elegeu o actual governo?
E se aludia a ambas, são perigosas porquê?

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Ontem foi dia das novas comarcas-piloto

Nos estudos de 2004 chamavam-se NUT's (Nomenclatura de Unidade Territorial), nome que soava a algo de impessoal e fazia lembrar os universos de Kafka ou de George Orwell.
Após muitos acertos e um percurso mais do que sinuoso, o novo mapa judiciário foi publicado em Diário da República a 26 de Janeiro, logo ali se prevendo a sua aplicação a partir de 14 de Abril em três comarcas-piloto: Baixo Vouga, Grande Lisboa Noroeste e Alentejo Litoral.
Bem à portuguesa, o caos dominou o dia de ontem nas antigas comarcas abrangidas pelas 3 novas grandes comarcas-piloto. Com a publicação em Agosto de 2008 da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto), a entrada em funcionamento dos novos tribunais já tinha sofrido o adiamento do costume. Na minha imodesta opinião, ao atraso não serão estranhos três factores:1º - O governo fala muito em investimento público, mas o meu padrinho só deve sonhar com grandes e modernos comboios e aviões; recalcamentos duma infância onde certamente abundaram brinquedos de menino rico. Entretanto e talvez com a excepção do novo e bem bonito Tribunal de Família de Oliveira do Bairro, as obras de contrução dos novos tribunais ou de adaptação e modernização dos existentes iam ficando para as calendas. Para nosso desespero e desencanto o concurso público de adjudicação das obras de construção do novo Tribunal de Oliveira do Bairro (uma referência a nível nacional, com a criação do chamado Tribunal Multiportas ou multifunções) foi adiado umas 4 vezes. É obra!
2º - O 25 de Abril pode ter chegado a muito lado mas as castas agarradas ao velho estado das coisas não se extinguiram: apenas mudaram de mãos e multiplicaram generosamente o seu número como ratos em celeiro cheio. Esta democracia modernaça dos Sócrates, Durões, Portas, Guterres e Cavacos é muito generosa, gosta muito de dar, de distribuir, de multiplicar (entre os seus e à vez, claro) os pães pelos pobres que agora são novos ricos. Uma espécie de Robins dos Bosques em circuito fechado que ilustrei AQUI.
3º - Os portugueses adoram o lufa-lufa das compras e do tratar das suas obrigações no último dia do prazo, assim a modos que in articulo mortis, à hora da morte.

Apesar de tantas vicissitudes, ontem fui um homem feliz: com a criação dum novo conceito territorial e de novos modelos de gestão, de atribuição de mais e melhores recursos técnicos e humanos e da especialização por comarca, finalmente algo de estruturalmente diferente e revolucionário acontece na complicada, tradicionalmente emperrada e muito conservadora máquina da Justiça.
A qualidade do serviço público prestado aos cidadãos salta à vista a quem entra nos tribunais: segurança e novas tecnologias é coisa que não falta. E mal precisamos de sair do nosso local de trabalho: a justiça está à distância dum clique nos nossos computadores.
Diga-se o que se disser e mau grado a diarreia legislativa, a Justiça é o patinho bonito deste governo.
O meu padrinho esqueceu-se do folar, mas mesmo assim,
Parabéns!

sexta-feira, 10 de abril de 2009

é preciso reformar a tropa!

Tem-se falado em instabilidade no seio das Forças Armadas. Parece que a malta quer melhores condições, que isto de vestir uma farda tem muito que se lhe diga.
Não é que eu seja saudosista, mas, gaita, esta nova geração do ar condiconado além do costumeiro aumento de vencimentos, quer o quê?
Se o Ramalho Ortigão fosse vivo desancava-lhes forte e feio no seu blogue pessoal e intimista...
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Scaner extraído das Obras Completas de Ramalho Ortigão \ Farpas Esquecidas \ vol. I \ Livraria Clássica Editora, 1946 \ pág. 105.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

De como a justiça real era benévola para alguns

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Imagem extraída da Collecção da Legislação Antiga e Moderna do Reino de Portugal \ Parte II \ Da legislação Moderna \ Tomo III \ Coimbra: Na Real Imprensa da Universidade \ Anno de MDCCCVII \ Por Resolução de S. Magestade de 2 de Setembro de 1786.
- Trata-se das Ordenações do Reino, no caso as Ordenações Filipinas, que estão divididas em 5 livros e estes em 3 tomos (volumes, na nomenclatura actual).
[para ler melhor ter em conta que a letra S tem aspecto estilizado. Mais ter em conta que barregã é a modos que prostituta, vendedeira de primaveras].

- Ver mais do mesmo no post de 27/8/2008, AQUI.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Os pequenos bandeirantes e o genocídio das sombrias

Ficam sabendo que o post anterior mais não serviu do que para abrir o apetite para um caso doméstico de consequências bem mais gravosas do que as ocorridas nos sertões brasileiros.
Desde há muito que o drama do desaparecimento dessa ave dos nossos tempos de rapazolas, a sombria de boa memória, me vem atazinando o espírito liberal mas ecológico de que sempre julguei ser senhor.
Quem viveu comigo os gloriosos tempos de meninice sabe muito bem do que falo. Nós vivíamos para “ir aos costelos”, sobretudo aos que roubávamos ao Jó, ao falecido primo Adélio e até àqueles a quem não estávamos ligados por laços de sangue.
Chegámos a fazer excursões pelo misterioso sertão que para nós eram as “terras das areias”, ali mais para as cercanias do mar. Munidos de frigideira e pequeno fogareiro a petróleo, chegámos a acampar por lá enquanto as largas dezenas de costelos aguardavam o romper da aurora e com ele a chegada das pobres sombrias e boieiras.
É mais por causa das primeiras que desabafo no divã psicanalítico que são os blogues. Sim, nós contribuímos para o extermínio da emberiza ortulana!!
Essa mesma, a sombria que fazia as nossas delícias na frigideira! A sombria ansiosa por depenicar o bichinho do milho atado bem ao centro do costelo! A sombria que, por isso mesmo, era gordinha e apetecível!
O Atlas da Aves que nidificam em Portugal Continental não precisava de dizer que o canto da sombria “audível a grande distância, começa a ouvir-se em meados de Abril”. Disso, a malta ainda se lembra!
Como se não bastasse, a carta de fls. 203 do Atlas dá-as como proliferando um pouco mais para o interior do centro e norte do país, em especial a Serra da Estrela. Não acredito!

Então e a miudagem de lá não toma uma atitude!

*
Ando a correr atrás do Outro,
como fazem
dois meninos brincando no jardim…
…até me achar, de repente,
sem saber como, o Outro lá da frente,
que vai fugindo de mim.
*

- Imagem do "Atlas das Aves que nidificam em Portugal "\ Coordenação de Rui Rufino \ Edição do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza \ Centro de Estudos de Migrações e Protecção de Aves (CEMPA) \ 1989.
- Poema de Sebastião da Gama (Brincadeira), extraído de Serra-Mãe – Poemas \ Colecção Poesia das Edições Ática \ 4ª edição.
[comprado em Outubro de 72, num intervalo de brincadeiras de má lembrança]

sábado, 4 de abril de 2009

Os bandeirantes e o genocídio dos povos nativos

Estes pequenos heróis da história colonial portuguesa sempre foram pouco divulgados entre nós. Não me lembro sequer de serem ensinados nos bancos da escola. Não acredito que o desconhecimento se deva ao facto dos Bandeirantes, a par do desbravar dos sertões brasileiros, terem semeado a morte e a doença entre os povos nativos que iam encontrando pelo caminho. A razão estará no patrioteirismo dos nossos historiadores, mais interessados na epopeia dos portugueses vista do lado nacionalista e expansionista. É que a par dos colonizadores portugueses, foram muitos os brasileiros envolvidos no rasgar do interior da enorme colónia que era o Brasil no séc. XVII.
Mas não deixa de ser interessante conhecer esta epopeia do colonialismo lusitano. Aqui bem perto, na Praça Marquês de Marialva, em Cantanhede, existe um bonito monumento a Pedro Teixeira, bandeirante, conquistador da Amazónia e filho da terra. E não falta na região norte do estado de Maranhão uma pequena cidade com o nome de Cantanhede, privilégio de que poucas terras portuguesas se podem orgulhar.
E agora digam lá que não somos uns patriotas!

sexta-feira, 3 de abril de 2009

O fiel amigo

A par do cão, é conhecido por ser o único amigo que nunca é infiel.
Conhecemo-lo por bacalhau e haverá mil maneiras de o cozinhar.
Os cientistas dão-lhe o nome de Gadus morhua e afiançam que a sua taxonomia é muito complexa, existindo várias espécies e subespécies.
Cá por mim, de complexo não tem nada, pois nem sequer é difícil de grelhar, cozer, fritar ou assar.
Já pesquei parentes próximos, como o badejo, mas a fisionomia do verdadeiro bacalhau é inconfundível.
Há uns anos atrás, outro amigo fiel - o Helder Luzio, conseguia-me uns exemplares frescos, a que eu dava o destino preferido: cozido em água, cebola e sal. Então as cabeças acompanhadas de couve e umas batatitas eram um verdadeiro regalo.
Ao que parece, são tempos que já não voltam.
A não ser que emigre para a Noruega ou a Islândia.
Sempre juntava o útil ao agradável...
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Bibliografia e foto: A EPOPEIA DOS BACALHAUS, de Francisco Manso e Óscar Cruz \ Distri Editora, 1984 [comprado na Bertrand, em Aveiro, aos 19.12.1984]

quinta-feira, 2 de abril de 2009

O Carnaval da Política - II

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Eça de Queiroz, em "UMA CAMPANHA ALEGRE, "As Farpas"" \ I Volume \ Lello & Irmão - Editores, Porto, 1965 \ reprodução da pág. 38 [comprado em Coimbra em Março do glorioso ano de 1969]

O Carnaval da Política - I

O blogue Thoughts on Mealhada, que há muito consta dos meus links da barra lateral ("blogues e sítios da Bairrada"), traz à baila mais uma recandidatura de César Carvalheira pelo PSD local, como candidato à Câmara.
Tal como refere o texto, trata-se de mais um vira-casacas do gaiteiro mundo da política. Conheci-o bem nos meus tempos de advocacia em Anadia, já lá vão 20 e tantos anos. Na altura, César Carvalheira ia à missa e aprendia catequese na escola do PS, crença que dava muito jeito a quem se dedicava essencialmente a empreitar obras de construção civil para o Estado e Autarquias Locais.
Mudaram-se os tempos políticos e com ele os actos de fé: Carvalheira passou a adorar outro bezerro de oiro...
O caso nem é virgem na região. Outro exemplar típico deste tipo de fauna é o Gilberto Madail da FPF, que também começou por ser catequista na igreja socialista.
Conheci-os ambos nesses tempos de fervorosa militância, que passava por umas agradáveis incursões pela noite aveirense...
Ainda recordo uma reunião duma distrital do PS [daquelas que se prolongavam madrugada adentro] e ouvir os camaradas chorar a perca de tão fervorosos adeptos; disse o que pensava, que gente daquela podia ser tudo menos desejada num partido de base humanista.
Comecei aí a despedir-me dum certo estilo e forma de estar na política e na vida.
No post seguinte faço questão de homenagear esse tipo de fauna.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Ração de combate: os dias da fome

Era uma ou mais caixas destas que levávamos para as operações de 2, 3 e até 4 dias, mato adentro.
Safavam-me as latas sul-africanas de fruta em calda que comprava na cantina do buraco chamado "aquartelamento"; a maior parte do conteúdo das rações distribuía-o democraticamente pelos bravos do grupo de combate.
Tudo gente do melhor que havia ao cimo da terra, verdadeiros camaradas a quem tratava por "Sr. Silva", "Sr. Santiago" ou "Sr. Adão".

Gente a quem ensinei o que era a liberdade, a democracia e até a Convenção de Genebra (foram centenas os prisioneiros que fizemos em 26 meses de comissão). Mas também gente que decidiu não estar ali para morrer.
O stress das operações constantes e uma ementa destinada a quem não passava de carne para canhão tiveram o efeito desejado: uma úlcera duodenal atirou-me para o Hospital Militar de Luanda durante 40 dias.
Parece que a úlcera continua, que a guerra está para durar, durar...